Sem alternativa – Um acordo que demorou 20 anos para ser fechado finalmente aconteceu. Mercosul e União Europeia concordaram em iniciar um processo de retirada de barreiras tributárias e administrativas em direção ao livre comércio. Trata-se da maior abertura ao exterior do País em toda sua história econômica, envolvendo 27 países (sem contar o Reino Unido) da Europa e quatro do Cone Sul.
No caso específico de automóveis e comerciais leves, que representam 94% de todos os veículos vendidos aqui, o impacto será grande, mas não imediato. Na realidade, as tarifas de importação dos produtos motorizados europeus só estarão zeradas dentro de aproximadamente 17 anos.
Para começar, estimam-se dois anos para aprovação em todos os 31 parlamentos nacionais envolvidos. Em seguida, os europeus poderão enviar ao Brasil 32.000 automóveis anualmente, durante sete anos, com desconto de 50% sobre os 35% do atual imposto de importação (II). Acaba, então, o regime de cotas.
A seguir um período de oito anos de redução do II, obedecendo a uma escala de redução anual, sem cotas: 28,4%; 21,7%; 15%; 12,5%; 10%; 7,5%; 5%; 2,5%. Pode parecer estranho, mas é isso mesmo. Após sair do regime de cota fixa e 17,5% de II, o período de livre importação começa com alíquota de 28,4% até a eliminação no 16º ano.
No fluxo oposto, os europeus impõem taxa de 10% de II, mas o Brasil não exporta, atualmente, para lá (já o fez com VW Fox, entre outros). Essa alíquota será zerada em intervalo bem curto, ainda por estabelecer. Está aí uma oportunidade para o País na faixa de automóveis e SUVs compactos, caso a lição de casa ocorra conforme se supõe.
Aliás, não há alternativa nos próximos 15 anos para a indústria automobilística aqui instalada sobreviver com um mínimo de dignidade e peso específico. O tempo é suficiente para rebaixar drasticamente o Custo Brasil e suas deficiências bem diagnosticadas: burocracia geral e fiscal sufocante, alta carga tributária, infraestrutura e logística da pior qualidade, ambiente ruim de negócios, descontrole dos gastos públicos, etc.
Aspecto interessante do acordo é o reconhecimento mútuo dos regulamentos técnicos (segurança, emissões e outros). Tornam os produtos europeus ainda mais competitivos, enquanto modelos dos EUA, Canadá, Coreia do Sul e até da China perderão atratividade. Há, no entanto, negociações em vista com os três primeiros dos quatro.
Também, a partir de agora, o Mercosul deve parar de brincar. Desde 1991 o comércio livre estava previsto. Mas, até o momento, o Brasil para cada US$ 1,50 exportado à Argentina tem que obrigatoriamente importar US$ 1, sem incidência de II. Esse assunto arrastado por quase três décadas exige uma solução. Cada país tem que se especializar em modelos específicos para ganhar escala de produção e aumentar poder de competição internacional.
Estratégias de todas as 20 marcas com instalações industriais hoje no Brasil precisam ser revistas desde já. Pode significar nível de investimentos para cima ou para baixo. Os que forem suficientemente rápidos farão do limão uma limonada. Quem vai ganhar mesmo é o consumidor graças à abertura do País para o mundo.
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Fernando Calmon